Page 11 - universidade-alcool
P. 11









FÓRUMUM P PALESTRANTE XALESTRANTE 2
FÓR

DR. MAURICIO FIORE

É importante dizermos também que, do ponto
A sociologia e a antropologia são disciplinas ir- de vista da ciência – seja as ciências humanas, bio-
mãs, e o professor Sergio Adorno já antecipou lógicas ou exatas –, não podemos tomar a expe-
um pouco do que eu falaria. Como “raízes” é um riência individual como um parâmetro confiável
termo controverso nas ciências sociais, então, para qualquer análise, como foi ouvido aqui: “Na
trarei alguns pressupostos da antropologia e das minha geração se usava de um jeito, hoje se usa de
ciências sociais como um todo nessa questão do outro.” O distanciamento é muito importante do
uso de substâncias psicoativas, tema que eu pes- ponto de vista científico para buscarmos os dados
quiso há algum tempo. e ambivalências. Outro exemplo: “Antes se usava
O uso de drogas é inerente à experiência
humana, e não pode ser apartado, inclusive, da direito, agora se abusa.” Os dados em relação à
universidade, como mostra a pesquisa coordenada
própria produção de uma condição humana, desde pelo prof. Arthur Guerra, indicam que as variações
as primeiras civilizações. E é importante destacar a não são tão grandes assim ao longo do tempo, nos
ideia de que nós dividimos essas substâncias, prin- últimos anos, no consumo universitário de drogas
cipalmente a partir do Século XX, de uma forma no Brasil.
simplista, pouco sofisticada, entre substâncias É bom reiterar que, principalmente no mundo
boas, ruins e aquelas outras, como o álcool, que contemporâneo pós-guerra do Século XX, as
tirando raras exceções, ficou à margem da regula- drogas não representaram apenas um sentido em
ção estatal por muito tempo – no caso do Brasil, seu consumo, e podemos identificar várias moti-
sempre foi deixado à margem de regulação, não vações, mas da transgressão e da liberdade. Não se
considerado uma droga, assim como o tabaco. Ou- trata de glamourizar esses sentidos, e sim constatar
tras foram controladas, do ponto de vista médico, e que esse é um fenômeno mundial, notadamente
usadas para fins medicinais, com controle médico, no Ocidente, onde o uso de drogas se associou à
e outras foram proscritas e proibidas. Essa divisão contracultura. Além disso, o potencial do fenô-
é simplista, e tem implicações decisivas nesta dis- meno da alteração de consciência tem uma relação
cussão, ainda que estejamos nos referindo especifi- importante com os congraçamentos e com os ri-
camente à universidade. Nenhuma substância deve tuais de passagem.
ser considerada boa ou ruim. Todas trazem riscos Para discutirmos uma política de drogas na uni-
maiores ou menores, e elas estão relacionadas aos versidade – ou em qualquer outro lugar – temos
contextos e às formas em que são consumidas. de considerar que não dá para colocar tudo em um
E, nesse sentido, já sabemos, por estudos qualita- mesmo lugar. O uso de drogas, ainda que possa
tivos e quantitativos, que o jovem, o adolescente acarretar danos individuais e sociais, e esses danos
são grupos privilegiados na experimentação e no têm uma escala de gravidade, até o ponto de se tor-
consumo mais intenso de parte dessas substâncias, narem trágicos, não podem ser considerados equi-
inclusive as ilícitas.
valentes, nem automáticos. O usuário de droga não


12
   6   7   8   9   10   11   12   13   14   15   16